segunda-feira, 16 de maio de 2016

Percepções


          O voo de 40 minutos entre São Paulo e Rio de Janeiro nunca pareceu tão demorado. Marcela estava ansiosa. Nos últimos dez anos esperava por este momento com toda sua perseverança e força.
            No portão de desembarque é recebida pelo seu irmão mais velho. Desde a morte de seus pais, Marci, era assim que ele a chamava desde pequeno, encontrou em Vicente um apoio em tempos turbulentos. Após um longo abraço banhado em lagrimas e sorrisos, Vicente segura o rosto de sua irmã não acreditando como ela estava linda resplandecendo de felicidade.
            - Querido irmão posso pedir um favor?
            - Claro , hoje é o seu dia. Como te negaria alguma coisa?
            - Você poderia parar em meu lugar favorito antes de irmos para casa?
            - Sim , maninha.
            Quando estaciona o carro Vicente percebe que aquele momento é único e muito especial para sua irmã ele sai do carro abre a porta e a deixa ir para aquele que seria um encontro dramático mas envolto de poesia que só pode assistir quem é amante da vida.
            Marcela fica descalça e com todo o cuidado, como estivesse pisando em vidro, segue em direção ao som que em sua memória era como uma antiga e repetitiva melodia que algumas vezes atingia seu auge em estrondos inquietantes. Sentiu medo, mas como aprendera ela não parou diante de seus fantasmas, ao contrário o desafiou e já se sentia vencedora. A brisa suave da manhã em seu rosto trazia consigo um convite: “Sinta, viva, mergulhe, este é o momento.” Sem pensar duas vezes ela corre e se lança em um mergulho profundo, sente seu corpo envolto pelas águas  revigorantes e misteriosas. Ao emergir acontece o momento mais esperado e significativo dos últimos anos de sua existência, ela podia enxergar,ver, olhar, mirar, fitar, contemplar a imensidão azul do Mar de Copacabana.
            Lembra-se da perda da visão, o primeiro diagnóstico de uma doença degenerativa da córnea, depois o tratamento sem apresentar resultados positivos, em seguida a indicação para um transplante de córnea, a espera angustiosa da lista de transplante até ser agraciada pela generosidade de um doador. A cirurgia, o risco de rejeição, as medicações e por fim a notícia tão desejada a total recuperação da visão. Por muitas vezes pensou estar lutando contra o inevitável mas naquele exato momento ela entendeu que nada é impossível para quem crê e luta com todo coração.



Autor: Katia R. Turri

Nenhum comentário:

Postar um comentário